25.10.16

OS GOVERNADORES E A PREVIDÊNCIA ESTADUAL

HÉLIO DUQUE -


Administrar a folha de pagamento do Estado vem sendo a prioridade dos atuais governadores brasileiros. A crise estrutural nas finanças públicas estaduais tornou-se um drama que aflora no cotidiano da sociedade de maneira nunca vista antes. A agenda das economias públicas estaduais tem na estagnação de déficits crescentes impenetrável caixa preta. O desequilíbrio fiscal que atingiu níveis recordes na estrutura do governo federal se estende praticamente por todas as unidades federativas com roupagem própria. O ciclo de endividamento atingiu padrão de absoluta insuportabilidade, agravado pelo populismo do mundo político. Os programas fantasias das administrações estaduais não resistem mais à realidade.

Acrescente-se o indiscutível despreparo público de vários governadores de Estado. Boa parte está mais preocupada com o seu destino e não com a população que se fazem representar. Sanear as contas públicas, enfrentando com coragem os desafios fundamentais para o futuro, preferem o caminho fácil da propaganda mistificadora. O Estado do Rio de Janeiro é um exemplo de deterioração das finanças públicas. E o mais grave: ele não é único, tem longa fila de governadores que o acompanha, com dramaticidade menor. A média das unidades federativas vive situação falimentar.

Os governos estaduais estão de pires na mão, relembrando a antiga música carnavalesca: “Me dá um dinheiro aí”. Os Estados transformaram-se em mendicantes do dinheiro público repassado pelo governo federal. O pagamento de salários e aposentadorias, por exemplo, vem sendo um drama. Nesse caso, a origem está na correção das remunerações maior do que a capacidade de arrecadação estadual. Agravada com o endividamento dos Estados, tendo o Tesouro nacional como avalista de financiamentos, em desacordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Governos populistas e submetidos às corporações (a exemplo do que ocorria no governo federal) adotaram a irresponsável contabilidade criativa. Agora estão colhendo o fruto.

O governador Rodrigo Rollemberg, do Distrito Federal, vem de constatar que 77% do orçamento é gasto com pessoal e inativos. Eleito pelo PSB, em uma coligação de esquerda, ele explicita que é fundamental uma nova esquerda enfrentar o corporativismo dos sindicatos de uma velha esquerda. Ao assumir o governo reduziu de 38 para 19 o número de secretariais e cortou 5 mil cargos de livre provimento. Exemplifica: “O corporativismo está contribuindo para amplificar e aprofundar as desigualdades sociais. Quando o Estado perde a capacidade de fazer investimentos nas áreas de infraestrutura, por que os recursos estão sendo drenados para o pagamento de salários, estamos aprofundando um cenário de desigualdade social”.

Na raiz da crise que afeta as finanças públicas dos 27 Estados brasileiros, o déficit atuarial é o mais grave. O orçamento está engessado, destacadamente nos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, onde a situação é mais grave. Nos demais a situação é de permanente agravamento. Hoje o déficit dos regimes próprios estaduais está por volta de R$ 64 bilhões, podendo em 2020 atingir os R$ 101 bilhões. Na totalidade dos Estados existem 1.440 milhão de servidores aposentados e mais 490 mil pensionistas. Já os servidores ativos são 2,6 milhões, equivalendo a diferença dos ativos e inativos a uma proporção insustentável no médio e longo prazo.

A previdência social dos Estados está quebrada. O que fazer? Na área federal a situação previdenciária é gravíssima. Ao formular projeto de reforma da Previdência, o governo federal passou a ter os governadores como aliados. A primeira alternativa é elevar a contribuição dos servidores dos atuais 11%, nos diferentes níveis de governo, para 14%. Seria gradual de 1% ao ano. As administrações estaduais elevariam a sua contribuição de 22% para 28%, gradualizada a 2% ao ano. Fixando em 65 anos a idade mínima futura para novas aposentadorias. Além de ampla revisão das aposentadorias especiais. O sistema previdenciário dos servidores públicos atingiu o estágio de esgotamento. Se a questão não for enfrentada com competência, a alternativa de calamidade pública será o futuro: não existirão recursos para o seu pagamento.

As irresponsabilidades fiscais dos Estados, com o agravamento da crise econômica, não puderam mais esconder da sociedade as deformações no custeio da máquina pública.

*Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.