13.11.16

IGNORÂNCIA GLOBAL NA AVALIAÇÃO DA VITÓRIA ELEITORAL DE DONALD TRUMP

JOSÉ CARLOS DE ASSIS -


Tive o privilégio de ser um dos poucos economistas políticos brasileiros que, bem antes da subida de Donald Trump nas pesquisas de opinião, saudei com dois artigos a possibilidade de sua vitória na corrida eleitoral norte-americana. Agora me delicio com a quantidade de comentários idiotas que muitos articulistas, comandados pelo inefável sistema Globo, despejam no pobre eleitor e telespectador brasileiro a respeito de todas as maldades que Trump fará contra o mundo e, principalmente, contra os imigrantes mexicanos.

A estrutura psicológica da esmagadora maioria dos jornalistas brasileiros está intimamente vinculada ao pensamento neoconservador e neoliberal norte-americano. E isso é o que há de pior no mundo em matéria de economia e de geopolítica. Trump, com seu jeito de arrombador de banco, não apenas representa o pensamento pragmático da contra-elite tradicional do país como bate de frente com Wall Street, o centro da acumulação financeira improdutiva dos Estados Unidos e, através deles, do planeta.

Salve Trump. Você veio ao mundo para abalar estruturas seculares de uma nação que havia se desviado da produção para a especulação, provocando, nas últimas quatro décadas, um processo inacreditável de acumulação financeira virtual que resultou numa concentração de renda de proporções escatológicas. Mais do que isso, você se desafiou na campanha para conciliar economia com geopolítica, tirando esta última, espero, das mãos dos geopolíticos sanguinários e promovendo a regeneração do sistema produtivo.

Nossos comentaristas, na sua vulgaridade, não percebem que a política externa norte-americana se desdobra em duas vertentes, uma, a geopolítica, e outra, a economia. Os geopolíticos cuidam do poder americano e, a partir da Segunda Guerra, se tornaram hegemônicos. A vertente econômica tem por base abrir espaço para a empresa americana no mundo. A hegemonia do pensamento geopolítico é extremamente ameaçadora para o mundo. Os chamados neoconservadores são genocidas em potencial com pele de cordeiro.

Sim, porque os neoconservadores, a fim de abrir passagem para suas propostas belicistas, buscam alianças com o estamento militar-industrial e com os setores sociais que defendem interesses dos pobres. Sua arte é matar no atacado fora dos Estados Unidos, não dentro. Exatamente como aconteceu no Iraque, no Afeganistão, na Primavera Árabe (veja o assassinato bárbaro de Kadafi), na Ucrânia. Não fora a brilhante reação de Vladmir Putin e a Síria também iria bombas abaixo. O objetivo último: reafirmar a prepotência americana.

Dos neoliberais sabemos todos nós no Brasil o que significam, porque conhecemos as consequências de suas imposições de política econômica especulativa ao governo brasileiro, desde Collor a Dilma, passado por FHC e Lula. Mas poucos se deram conta da articulação neoconservadores-neoliberais, eixo da proposta de Hillary Clinton, na campanha americana. De fato, o casal dividia o pódio: ela atendia às expectativas belicistas dos neoconservadores, ele as expectativas econômicas do estamento neoliberal de Wall Street.

A derrubada espetacular dessa dupla pelas razões mais desencontradas é prova de que a história, assim como presumivelmente a Justiça, marcha às cegas. O povo norte-americano não elegeu Trump exclusivamente em razão de suas posições externas ou industrialistas. Mas o elegeu sabiamente. Estamos, hoje, um pouco mais distantes de um guerra global com a Rússia, comandada pelos Estados Unidos, e mais próximos de soluções pragmáticas para os inevitáveis conflitos econômicos e comerciais entre a maior economia do mundo e a Ásia.

Do nosso lado não deixa de ser divertido ver a tevê Globo, que havia feito contra Trump uma “campanha” tão ou mais facciosa que fez contra Dilma em 2014, continuar atacando o candidato eleito, talvez com a ambição de criar argumentos, também lá, para um processo de impeachment mesmo antes da posse. É patética a exibição de manifestações, algumas delas ridículas pelas dimensões, contra o novo presidente americano. Só se explica isso pelo jeito Globo de ser: alguma verba perdida da dupla Clinton. Apesar dela, que viva Trump!