Por JOAQUIM DE CARVALHO - Via DCM -
O delegado da PF Paulo Cassiano Júnior. |
Não tenho motivo para defender o ex-governador Anthony
Garotinho, preso sob acusação de chefiar um esquema de compra de votos através
de um programa social de Campos.
Mas, depois que escrevi aqui que a prisão dele era suspeita —
casos explícitos de uso do poder econômico para manipular resultado de eleição
não teve repercussão judicial, caso do prefeito eleito de São Paulo João Dória,
acusado pelos próprios correligionários de comprar apoio para ser indicado
candidato –, recebi algumas mensagens de leitores que me chamaram a atenção.
“Você precisa saber o que acontece em Campos”, disse uma
leitora a respeito da atuação do delegado da Polícia Federal que prendeu o
ex-governador depois de comandar o inquérito que apurou supostas
irregularidades no programa social Cheque Cidadão, um tipo de Bolsa Família
local que tem raízes anteriores ao próprio programa do Governo Federal.
O delegado da PF, Paulo Cassiano Júnior, teria feito campanha
para o candidato que derrotou o grupo de Garotinho na cidade.
Achei difícil de acreditar.
Mas fui verificar através de links que ela me mandou e vi
que, no dia 12 de setembro do ano passado, quando as pesquisas indicavam uma
disputa apertada na cidade, saiu do celular (22) 99981-9922 a seguinte
mensagem:
“Amados amigos, a corrente do bem não para de crescer.
Aproxima-se o dia em que Campos será libertada da escravidão e devolvida e
devolvida aos seus legítimos usufrutuários: os campistas. Vai ser diferente!!!”
A última frase – “Vai ser diferente” – era o slogan da
campanha de Rafael Diniz, do PPS, o candidato que acabaria derrotando o
candidato de Garotinho.
O celular (22) 99981-9922 era um dos números pessoais
utilizados pelo delegado da PF.
Paulo Cassiano Júnior foi denunciado à Justiça eleitoral por
suspeição na condução do inquérito que, afinal, apurava crime eleitoral.
Mas a mesma Justiça que determinou a prisão de Garotinho
ignorou a denúncia. E o delegado, questionado pela imprensa local, não quis
responder:
— Só falo sobre as provas dos autos.
Mas ontem, depois da prisão, disse às emissoras de TV:
— Garotinho chefia uma organização criminosa.
Campos já foi uma das maiores produtoras de cana de açúcar e
estive lá em 1996, para uma reportagem sobre trabalho infantil que acabaria
recebendo o Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos.
Encontrei crianças no canavial, comandada por feitores que se
deslocavam de cavalo, enquanto elas, de facão na mão, deitava as canas, sob sol
inclemente.
Algumas delas tinham dois anos de escolaridade. Foram
justamente os anos em que vigorou na cidade um programa patrocinado por uma
fundação alemã, em parceria com a prefeitura de Campos.
A prefeitura repassava aos pais dos alunos um dólar doado
pela fundação alemã para cada dia de frequência das crianças na escola. Graças
a isso, pais tiraram os filhos do canavial e a colocaram no banco da escola.
Fiz as contas e escrevi que era relativamente barato tirar as
crianças do trabalho – 22 dólares por mês. O assunto ganhou repercussão
nacional e o bolsa escola, pioneiro em Campos, já em vigor no Distrito Federal,
se expandiu até virar o bolsa família.
O prefeito que fez esse convênio com a fundação alemã era
Garotinho, que depois se elegeria governador do Rio de Janeiro – programa
social dá voto. O prefeito que veio em seguida não deu sequência ao programa,
naquela ocasião.
O que aconteceu em Campos agora, com a prisão de Garotinho e
o engajamento do delegado da PF na campanha eleitoral, é o reflexo do que
acontece num plano maior.
O delegado que chefia a Lava Jato, em Curitiba, participava
de um grupo no Facebook, antes da eleição presidencial de 2014, chamado
Organização de Combate à Corrupção, que tinha como símbolo a caricatura de
Dilma e uma faixa vermelha com a frase “Fora, PT!”.
Um subordinado desse delegado postou foto ao lado de um alvo
cravejado de balas. No centro do alvo, o rosto da então presidente da
República.
Quem pensa que a Lava Jato era um assunto local, restrito a
Curitiba, se enganou. Quem acha que Garotinho é um assunto paroquial, restrito
a Campos, também pode estar equivocado. A caça já começou. Quem será o próximo
alvo?