22.6.17

A POLÍTICA DA SUBJETIVIDADE

ANDRÉ BARROS -
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Experiente psicanalista, no auge de seus 71 anos, Ana Lúcia Barros, minha mãe, costuma dizer que está “muito bem para a idade”, e é isso mesmo o que todos confirmam: ela é jovem, bonita, e ainda esbanja cultura e sabedoria. Ela gosta de lembrar que, embora não seja maconheira, sempre foi da luta pela legalização da maconha, desde os tempos do Gabeira. Outro dia, rolava um papo entre nós dois sobre outro antigo companheiro, o César Benjamin, histórico guerrilheiro, hoje Secretário de Educação do Crivella. Discordamos dos diferentes rumos políticos tomados pelos companheiros, mas guardamos a política da amizade.

Eu e minha mãe conversávamos justamente sobre o corte da verba das escolas de samba feito pelo prefeito da cidade maravilhosa, mundialmente conhecida pela alegria, futebol e carnaval. Ele usou a necessidade de um remanejamento do dinheiro para as creches como justificativa para tal corte. Diante dos históricos problemas das crianças negras e pobres nas creches públicas, sabemos de antemão que essa verba é insignificante. Numa cidade em que se atira de fuzil em professoras e crianças dentro de creches e escolas das favelas, onde sobrevive uma população de maioria negra, sem saneamento básico e crivada de balas, não me venham com essa conversa de que agora resolveram se preocupar com as criancinhas! Isso não passa de um discurso moralista que quer matar o samba e a alegria. Como eu sou do samba, isso é uma contradição, pois tem mais é que cortar, e esse é o aspecto positivo, mas não por moralismo e fundamentalismo religioso. Se alguém vai fazer esse trabalho, que seja então o prefeito da Igreja Universal. Rapidamente evaporados durante a passagem ao vivo e a cores pela telinha, quem lucra mesmo com os gastos estratosféricos das escolas de samba, com suas imensas alegorias e shows pirotécnicos, é a televisão. Uma das campeãs do carnaval deste ano declarou que o seu desfile custou a volumosa quantia de 8 milhões de reais. O “campeonato do samba” virou o campeonato das escolas ricas e poderosas, o que significa detentoras de poder econômico. Sou Império Serrano e toquei durante 25 anos na bateria da escola de fabulosos sambas históricos. Em 1982, quando foi pela última vez campeã, com o antológico samba de Aluísio Machado e Beto Sem Braço, minha escola da Serrinha denunciou:

Super Escolas de Samba S/A
Super-alegorias
Escondendo gente bamba
Que covardia!”

Voltando ao Prefeito, sabemos que esse corte é contra a alegria, pois, como no dito popular, tudo que é bom engorda ou é “pecado”. Na disputa por esse mercado, não querem que as pessoas dancem, bebam, fumem, nem curtam o samba. Querem que a alegria vire dízimo para as poderosas Igrejas: esse é um forte exemplo do que é a política da subjetividade.

Esta mentalidade é perigosa para a causa da maconha. Começam a circular projetos de lei para internar, sem ordem judicial e compulsoriamente, consumidores de substâncias tornadas ilícitas, chamadas de drogas ilegais. Não pensem que essa medida irá alcançar apenas os consumidores de crack na miséria cuja imagem é tão explorada pela mídia. Querem ter plenos poderes para internar de qualquer forma, sem flagrante delito nem mandado judicial, como acontecia na ditadura, quando as pessoas ficavam presas e incomunicáveis por 60 dias.

A maconha não tem nada a ver com essa subjetividade individualista e capitalista do neoliberalismo que quer ver todos trabalhando horas sem parar, por toda a vida, sem jamais se aposentador. Quando as diretrizes neoliberais vêm acompanhadas pelo fanatismo religioso, veja só o resultado, nós só temos uma opção para a vida: trabalhar sem parar, rezar sem parar, enquanto diversão e alegria, nunca! A subjetividade maconheira irrita a caretice hipócrita: uma vida tranquila, trabalhando com criatividade, curtindo o sexo, a larica e a preguiça do abridor natural de apetites.